terça-feira, 7 de setembro de 2010

Cultura, lazer e direito à cidade.



É claro que depende da manifestação cultural. A cultura não é inocente. Nem toda manifestação cultural é libertária e promove valores democráticos, de igualdade e fraternidade. O racismo, o nazi-facismo, o machismo, o individualismo, e outras tendências opressivas e socialmente desagregadoras, porque precisaram constituir identidades sociais, precisaram também produzir manifestações culturais como elementos de representação de identidades sociais.

Mas, práticas de lazer cultural são fundamentais para promoção de oportunidades de boa convivência social nas cidades. Quando olhamos um grupo de xavantes dançando e contando juntos, ou uma roda de samba, ou um bloco de carnaval, e comparamos essa situação com pessoas caminhando apressadas, de um lado pra o outro, numa grande avenida metropolitana, entendemos que as manifestações culturais, especialmente aquelas em que nascem da tradição popular e onde o público participa ativamente, são fundamentais para a promoção da convivência social.

De um lado, a cultura torna-se um fenômeno cada vez mais visível nas grandes cidades, do outro a gestão urbana passa a ter um interesse cada vez maior pela cultura e para as práticas culturais. Surge daí o perigo da instrumentalização das práticas culturais para fins de valorização imobiliária.

A Cidade da Música, onde jaz (sem jazz) o dinheiro público, pode ser considerada o melhor exemplo do que se pode fazer de pior, nesse sentido. Uma obra faraônica, não só pela escala do edifício, como também pelo custo: inicialmente previa um custo inferior à R$ 100 milhões, teve seu orçamento várias vezes revisto, sempre para mais e hoje se espera que finalmente custe aproximadamente R$ 600 milhões.

Não se pode deixar de mencionar ainda que, do ponto de vista arquitetônico, contratou-se um arquiteto estrangeiro sem realizar concurso público. Não se trata de fazer juízo estético ou pregar o isolamento cultural, ou qualquer coisa assim, mas simplesmente defender que os arquitetos brasileiros tenham a chance de concorrer em igualdade de condições, em um concurso público, quando se trate de obras realizadas com dinheiro público de brasileiros. Arquitetura também é cultura.

Porém, o mais importante: com o dinheiro empatado na cidade da música, poder-se-ia produzir vários centros culturais em diferentes pontos da cidade, especialmente na zona norte, promovendo a desconcentração metropolitana desse tipo de equipamento, tão importante para a convivência social na cidade.